sábado, 21 de maio de 2011

Impugnação de Normas Administrativas

A Impugnação de Normas Regulamentares

Breve análise histórica:

Conforme escreve o Professor Vasco Pereira da Silva, a reacção contenciosa contra regulamentos administrativos antes da reforma do Contencioso Administrativo de 1985, poderia ser feita através de 3 meios distintos.

O primeiro deles corresponde à “via incidental”, onde não havia uma apreciação directa do regulamento cuja ilegalidade se sustentava. Ao invés, o que sucedia era a sua apreciação indirecta como incidente da questão principal. O acto administrativo poderia assim, vir a ser considerado nulo se se considerasse que a sua prática teria decorrido da aplicação de um regulamento inválido. A consequência era a desaplicação do regulamento inválido ao caso concreto.

O segundo era um meio processual genérico, onde a declaração de ilegalidade das normas administrativas, prevista nos arts. 66 e ss. do LEPTA, correspondia a um meio utilizável contra qualquer norma regulamentar, desde que se tratasse de uma norma exequível por si mesma, ou se já tivesse sido, de acordo com o meio falado anteriormente, declarada ilegal em 3 casos distintos (art. 51º do ETAF).


O terceiro meio de reacção contenciosa contra normas regulamentares era através do recurso aos arts. 63 e seguintes da LEPTA. Este meio tinha um âmbito de aplicação limitado, pois respeitava apenas a regulamentos provenientes da denominada administração local comum, mas em contrapartida não estava sujeito às condições estabelecidas para a via anterior, verificando-se uma espécie de assimilação processual dos regulamentos aos actos administrativo.

O regime pós revisão constitucional de 1997

A revisão constitucional de 1997 veio consagrar expressamente no art. 268º, n.º 5, o direito de impugnação judicial directa de normas administrativas com eficácia externa, quando ponham em causa direitos ou interesses legalmente protegidos dos particulares.
Vejamos de seguida o regime que vigora actualmente no que concerne à impugnação de normas administrativas.

Do objecto

A título principal, o lesado pode (i) pedir a declaração de ilegalidade de normas administrativas com fundamento em vícios próprios, isto é, com efeitos circunscritos ao caso em análise, que corresponde à invalidade própria. Caso a sua pretensão seja procedente, a norma será desaplicada; (ii) ou a declaração de ilegalidade de normas decorrente da invalidade de actos praticados no âmbito do procedimento de aprovação, art. 72º/1, a chamada invalidade derivada. Aqui o lesado obterá o reconhecimento, com força obrigatória geral, de que estamos perante uma normal ilegal (arts. 72º e 73º CPTA). O art. 72º/2 ressalva os casos em que o pedido se funde numa inconstitucionalidade directa, caso em que a justiça administrativa não será naturalmente competente.

Da legitimidade e das condições de impugnação

É atribuída a legitimidade para impugnar normas, a qualquer particular que se sinta lesado ou que possa previsivelmente vir a sê-lo num momento próximo, caso a norma em casa venha a ser aplicada. O professor Vieira de Andrade entende que a legitimidade também é extensível a pessoas colectivas públicas, quando esteja em causa a ofensa de interesses que lhes cumpram defender. Também o Ministério Público, como garante da defesa da legalidade, terá legitimidade para propor a impugnação de normas administrativas.
A declaração de ilegalidade com força obrigatória geral nem sempre pode ser pedida pelos particulares. Com efeito, exige-se a anterior desaplicação em três casos concretos da norma visada. Sendo certo que essa desaplicação tanto pode ter ocorrido através da via principal (impugnação de casos concretos) como pela via incidental (desaplicação de normas aplicadas pelo acto). Já o Ministério Público não tem este entrave, podendo pedir a declaração de ilegalidade em qualquer altura, sendo sua obrigação fazê-lo, caso tenha conhecimento de 3 casos concretos em que a norma foi desaplicada (art. 73º/4).
No que respeita à declaração de ilegalidade da norma com efeitos restritos ao caso concreto, esta pode ser pedida pelo lesado ou pelos titulares do direito de acção popular assim que a normal produza os seus efeitos, não estando dependente de um acto administrativo de aplicação. O art. 73º/2 afasta a necessidade da desaplicação em três casos concretos neste meio de impugnação.

O prazo e a cumulação de pedidos

Quanto ao prazo para o pedido de declaração de ilegalidade, indica o art. 74º que ele pode ser feito em qualquer momento, no entanto convém não esquecer que mercê da necessidade de existência de três casos de desaplicação da norma em caso de pedido com força obrigatória geral, haverá um diferimento temporal até que esses três casos sejam atingidos, razão pela qual o particular não poderá intentar a acção a todo o tempo.
O art. 4º do CPTA consagra o princípio da livre cumulabilidade de pedidos. Com tal preceito é possível num mesmo processo cumular diferentes pedidos desde que exista entre eles uma conexão que justifique tal cumulação. Assim, e nos termos do nº. 2, alínea b) do supra citado artigo é possível cumular o pedido de ilegalidade da norma com o pedido de anulação ou declaração de nulidade de actos administrativos que a tenham aplicado, bem como com o pedido de condenação da Administração ao restabelecimento da situação actual hipotética.

Os efeitos da declaração de ilegalidade


Quanto aos efeitos da declaração de ilegalidade a lei apenas se refere expressamente aos casos em que esta é declarada com força obrigatória geral (art. 76º).
A declaração de ilegalidade com força obrigatória geral produz os seus efeitos retroactivamente à época da origem dos factos a ela relacionados. Além disso, determina a repristinação das normas revogadas (nº 1 in fine). Contudo nem sempre tal sucederá, na medida em que o Tribunal poderá determinar que os efeitos se produzirão apenas para o futuro, caso estejamos perante necessidades de salvaguarda da segurança jurídica, da equidade ou de interesse público de excepcional relevo (nº2).
No que concerne aos efeitos da declaração de ilegalidade no caso concreto, o professor Vieira de Andrade entende que também estes operam ex tunc e que também possuem alcance repristinatório, embora se produzam apenas naquele caso.

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