segunda-feira, 9 de maio de 2011

O DIREITO DE ACÇÃO POPULAR NO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO

A acção popular, de entre a multiplicidade de interesses, ocupa-se, prima facie, dos denominados interesses difusos. Têm sido avançadas várias definições para a categoria dos interesses difusos, podendo-se dizer que será o interesse, juridicamente reconhecido, de uma pluralidade indeterminada ou indeterminável de sujeitos, eventualmente unificada mais ou menos estreitamente com uma comunidade e que tem por objecto bens não susceptíveis de apropriação exclusiva.
O direito de acção popular consagrado no artigo 52º/3 da Constituição da República Portuguesa (doravante, CRP), no capítulo referente aos direitos, liberdades e garantias de participação política, é um instrumento de participação e intervenção democrática dos cidadãos na vida pública, de fiscalização da legalidade, de defesa dos interesses das colectividades e de educação e formação cívica de todos.
Na definição de ROBIN DE ANDRADE, no seu trabalho sobre “A acção popular no Direito Administrativo Português”, o direito de acção judicial conferido pelo direito de acção popular é um direito autónomo à prestação de uma actividade jurisdicional, por parte dos órgãos competentes do Estado, traduzindo-se na atribuição de um direito subjectivo. Apesar de ser considerado um direito autónomo, ele não é de carácter abstracto nem desprovido de finalidade, sendo a garantia de determinado direito substantivo material.
MARCELO CAETANO, por sua vez, considera que a acção popular constitui uma faculdade de fiscalização cívica, concedida a determinados indivíduos que satisfaçam certos requisitos de legitimidade, para, usando a via contenciosa, obterem a anulação de resoluções administrativas que considerem lesivas de interesses de colectividades locais ou, actuando em nome próprio e no interesse das autarquias, intentarem acções no foro judicial, necessárias para manter, reivindicar e reaver bens ou direitos do corpo administrativo. Nesta definição estão abrangidas as duas modalidades típicas de acção popular: acção popular supletiva, que visa suprir a inércia dos órgãos administrativos e, acção popular correctiva, forma de contencioso objectivo que tem por finalidade a defesa da legalidade administrativa.
A Constituição da República Portuguesa não deu sempre o mesmo tratamento ao direito de acção popular. Foi com a Revisão Constitucional de 1989 que o legislador ampliou consideravelmente o âmbito deste direito. As precisões introduzidas no novo texto constitucional tiveram como propósito aprofundar e desenvolver as condições de acesso à justiça e reforçar a tutela de interesses difusos. Contudo, a formulação decorrente das sucessivas revisões constitucionais não prima pela limpidez, na medida em que se denota uma patente ambiguidade entre o que é tido por acção popular e o que se deverá supor ser a protecção de interesses difusos.
Coloca-se agora a questão de se saber como é que a CRP tutela os interesses difusos. A C.R.P. dedica os seus artigos 60º, 66º e 78º à protecção dos consumidores, direito ao ambiente e património cultural, respectivamente, podendo estes direitos ser defendidos através da acção popular. Temos também a nível de legislação ordinária e de participação procedimental vários diplomas que consagram a defesa destes direitos, nomeadamente, a Lei de Bases do Ambiente e a Lei de Defesa do Consumidor. É importante referir também o Estatuto do Provedor de Justiça e o papel que tem sido atribuído ao Ministério Público (221º CRP) na obrigatoriedade da sua intervenção em processos que estejam em causa interesses públicos.
O artigo 53.º do Código de Procedimento Administrativo consagra, também, a legitimidade para a protecção de interesses difusos aos cidadãos a quem a actuação administrativa provoque ou possa provocar prejuízos relevantes em bens fundamentais como a saúde pública, habitação, educação, património cultural, ambiente, ordenamento do território e qualidade de vida, assim como aos residentes na circunscrição em que se localize algum bem do domínio público afectado pela acção da Administração.
A questão dos interesses difusos não tem sido tratada frequentemente na jurisprudência, o que revela a fraca protecção conferida a estes direitos. Apesar de tudo, as vantagens do direito da acção popular são evidentes. Podemos constatar a existência de um regime especial de custas para tais acções, regime este que determina a sua isenção (20º Lei da Acção Popular), e ainda, mesmo para os casos de improcedência parcial do pedido, a intervenção processual do juiz - que é amplíssima - e, bem assim, a eficácia do caso julgado; evidenciando-se assim, um claro incentivo e convite à defesa e salvaguarda dos interesses materiais atrás mencionados.


BIBLIOGRAFIA:

-Andrade, Robin A acção popular no direito administrativo Português,
Coimbra, 1967.

-Andrade, Vieira de – A justiça administrativa (Lições), 2011

-Bielsa, Rafael — A acção popular e o poder discricionário da administração,
Revista Forense.

-Marques Antunes, O Direito de Acção Popular no Contencioso Administrativo, 1997

-Raposo, Mário Os direitos das pessoas e o interesse geral, Provedoria
de Justiça, 1991.


Ana Cristina Aguiar
Nº17126

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