terça-feira, 3 de maio de 2011

Pressuposto processual: interesse processual vs legitimidade


Dedicarei algumas linhas, nesta primeira parte do trabalho (sendo a segunda sobre o recurso hierárquico necessário e o interesse em agir), à análise do pressuposto processual legitimidade e interesse em agir, de forma, espero, sintética e clara.
Sendo a legitimidade o elo de ligação entre a relação jurídica substantiva e a processual, destinando-se a trazer a juízo os titulares da relação material controvertida, a fim de dar sentido útil às decisões dos tribunais, o interesse processual ou interesse em agir, não se confundindo com aquele, traduz-se na necessidade efectiva de tutela judiciária/de um interesse real e actual e, portanto, de factos objectivos que tornem necessário o recurso à via judicial. Por outras palavras, exige-se a verificação da utilidade na procedência do pedido, decorrente da ideia de economia processual. Daí, pode não haver dúvidas quanto à questão de saber se quem está em juízo é parte na relação material controvertida e, no entanto poder questionar-se a existência de uma necessidade de tutela judiciária.
O CPTA não consagra, em termos gerais, o interesse em agir como um pressuposto processual, mas contém uma referência expressa a este requisito, designadamente no art. 39.º, a propósito das acções de simples apreciação, que visam ocorrer a lesões efectivas, consequentes da existência de situações graves de incerteza objectiva, ou a ameaças de lesão, resultantes do fundado receio da verificação de condutas lesivas num futuro próximo, determinadas por uma incorrecta avaliação da situação existente. Também as situações em que estejam em causa a condenação da Administração à não emissão de actos administrativos (art.37.º/2 al. c)), aplica-se igualmente o regime do art. 39.º (Prof. Vieira de Andrade e Mário Aroso de Almeida).
Assim, na acção administrativa comum, o interesse processual complementa a legitimidade activa, na medida em que não basta a titularidade da posição jurídica substantiva para justificar o recurso aos tribunais a fim de obter a sua apreciação (em que por exemplo uma acção de reconhecimento de uma situação jurídica subjectiva só faz sentido se houver uma situação de incerteza, uma ameaça ou o fundado receio de que a Administração adopte uma conduta ilegal e lesiva).
Já no que toca à acção administrativa especial, a questão é mais polémica. Defendem os autores supra referidos que (ao contrário do Sr. Prof. Vasco Pereira da Silva), que no art. 55.º/1 al. a), embora misturado com a questão de legitimidade, surge uma manifestação do mesmo requisito na exigência de um carácter “directo” ao interesse individual para impugnar actos administrativos. Deste modo, quando se exige que o interesse do impugnante seja “directo”, no sentido que ele deve ser actual, está a fazer-se apelo à ideia de que o impugnante deve estar constituído numa situação de efectiva necessidade de tutela judiciária.
Mais. O Prof. Mário Aroso de Almeida, afirma a existência de interesse em agir em situações de ameaça de lesão, mas que ainda não lesaram ninguém, resultantes do fundado receio da verificação de circunstâncias lesivas (art. 54.º/1 al.b)).

Assim, e seguindo a posição defendida pelos Prof. Vieira de Andrade e Aroso de Almeida, questão que se coloca, independentemente do tipo de acção, é a de apurar, em cada caso concreto, se quem se propõe impugnar esse acto se apresenta como parte legítima e, por outro lado, que do ponto de vista do interesse em agir, fundamente a necessidade de recorrer à via judicial.


ALMEIDA, Mário Aroso, O novo regime do processo nos tribunais administrativos, 4.ª edição, 2005.

ANDRADE, José Carlos Vieira, A justiça administrativa, 10.ª edição, Almedina, 2009.

SILVA, Vasco Pereira, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2.ª edição, Almedina, 2009.

Sem comentários:

Enviar um comentário