domingo, 27 de março de 2011

Acção Administrativa Especial - Impugnação de actos

O meu post reflete apenas um resumo feito por mim a propósito da Acção Administrativa Especial, dos manuais do Professor Vieira de Andrade, Mário Aroso de Almeida e João Caupers. Penso que seria uma maneira de introduzir alguma luz sobre a matéria e proporcionar alguma troca de discussão relativamente a dúvidas que possam surgir dentro do tema.

Da conjugação dos artigos 35º e 36º do CPTA resulta a consagração do Princípio da Tipicidade das Formas Processuais, o qual consagra essencialmente dois tipos de meios: a acção administrativa comum e a acção administrativa especial.
A diferença entre ambas é bastante fácil, para o Professor Caupers, sendo que na acção administrativa Comum os pedidos tem uma natureza tal que considerados em abstrato poderiam ser dirigidos contra um particular, enquanto que na acção administrativa especial os pedidos reportam a comportamentos juridicos ou omissões de comportamentos e, em abstrato, não eram passíveis de serem reportados a particulares. Para o Professor Vieira de Andrade, a diferença entre as formas de processo depende de estarmos ou não perante uma situação em que está ou não presente a prática de manifestação de poderes públicos ou de autoridade da Administração; se existe ou não uma relação juridica tendencialmente "paritária entre as partes".

Acção Administrativa Especial
A Acção Administrativo Especial foi concebida para os litígios cujo objecto seja uma pretensão ou pretensões emergentes da emissão ou da omissão de actos administrativos ou de normas de direito administrativo.
O âmbito desta acção, segundo o artigo 46º, nº1, é exactamente este que enunciei - Seguem a forma de acção administrativa especial os processos relativos a pretensões emergentes da prática ou da omissão de actos administrativos ou de disposições de direito administrativo.

Pressupostos:
1. Competência dos Tribunais Administrativos;
2.Recorribilidade do acto;
3. Legitimidade;
4. Tempestividade do Recurso.

Pedidos:
- No que respeita aos Actos Administrativos:

* Processos Impugnatórios:
- Pedidos de Anulação ou Declaração de Nulidade ou Inexistência de actos - artigo 46º/2, a), c) e d) CPTA;
- Pedido de Condenação à prática de acto legalmente devido- artigo 46º/2, b) CPTA;

- Quanto aos Regulamentos:
* Pedidos de Declaração de Ilegalidade de normas com Força Obrigatória Geral;
* Pedidos de Declaração de Ilegalidade de Normas em casos concretos;
* Pedidos de Declaração de Ilegalidade por omissão de Regulamento.


IMPUGNAÇÃO DE ACTOS ADMINISTRATIVOS
O Objecto desta impugnaçao é o controlo da invalidade de actos administrativos.
É importante referir que só poderemos impugnar actos que sejam de facto impugnáveis e como tal é necessário ter um conceito de acto administrativo impugnável:
– Este conceito começa por pressupor um conceito material de acto administrativo – “as decisões materialmente administrativas de autoridade que visem a produção de efeitos numa situação individual e concreta” – seja qual a forma que revista;
- Ficam de fora: os puros actos instrumentais (actos jurídicos como a generalidade das propostas, pareceres, comunicações, etc.), as operações materiais ( actos de exercício e de execução) e comportamentos (informações, avisos), actos internos (aqueles que visem produzir efeitos nas relações intra-pessoais).

É importante referir que o conceito processual de acto administrativo impugnável não coincide com o conceito de acto administrativo, sendo muito mais vasto, na sua dimensão (não depende da qualidade administrativa do autor do acto, inclui, não só decisões tomadas por entidades privadas que exerçam poderes públicos, como ainda actos emitidos por autoridades não integradas na A.P.); e mais restrito de certo modo ao só abrangir expressamente as decisões administrativas com Eficácia externa, ou seja, os actos administrativos que produzem ou constituam, ou visem constituir, ou que sejam capazes de constituír, efeitos nas relações jurídicas administrativas externas, independentemente da respectiva eficácia concreta.
Nos actos de efícácia externa podemos incluir: os actos destacáveis (aqueles que, embora inseridas num procedimento, produzam efeitos jurídicos externos autonomamente, sem ser através do acto do procedimento).

O Professor Vieira de Andrade refere contudo que existe problemas em saver se são impugnáveis as decisões administrativas preliminares (pré-decisões, pareceres vinculativos) que determinem peremptoriamente a decisão final de um procedimento com efeitos externos, mas que não tenham elas próprias capacidade para constituir tais efeitos externos, que só se produzam através dessa decisão final. Embora em rigor, os actos não visem directamente produzir o efeito que pode ser lesivo, poderá sustentar-se e aceitar-se a impugnabilidade dessas “decisões” – parece que não estando essa impugnabilidade determinada no artigo 51º do CPTA, ela deve ou deveria decorrer expressamente ou inequivocamente de uma lei.
Aqui estará um ponto que talvez devessemos discutir e ponderar. Será que podemos impugnar estas decisões, tendo em conta que o 51ºCPTA não lhes confere carácter impugnatório? A meu ver, sendo o critério da Eficácia Externa tão importante para se considerar um acto impugnável, poderiamos considerar impugnável tais decisões, que ainda que não possuindo elas proprias capacidade para criarem efeitos externos na esfera jurídica das partes, visam fazê-lo, necessitando apenas de outro acto. Contudo, é controvertido dizermos isto, visto que na verdade o acto que tem eficácia externa seria este ultimo...mas parece-nos correcto admitir a impugnabilidade de uma decisão que pode ter consequências tão severas no procedimento.


a. A Impugnação de acto meramente confirmativo:
Em primeiro lugar, precisamos de saber o que é um acto meramente confirmativo.
A finalidade deste conceito prende-se com o objectivo de evitar que, através de requerimentos sucessivos, se pudessem permanentemente reabrir litígios, defraudando a estabilidade inerente ao prazo de impugnação dos actos administrativos.
No entanto, este conceito de acto meramente confirmativo teve de ser afinado pela doutrina e pela jurisprudência, em função da variedade de interesses em jogo nos diversos tipos de situações.
O CPTA, no art.53º, parece pressupor a utilidade da figura e a sua substância, mas visa apenas limitar a invocação do carácter confirmativo do acto impugnado para efeitos de rejeição da impugnação, não admitindo tal rejeição, designadamente quando o acto anterior não tenha sido notificado ao autor ( ou não tenha sido objecto de publicação, se não tinha de lhe ser notificado).

b. Impugnação de acto administrativo ineficaz
A lei (art.54º) permite a impugnação de actos (ainda) ineficazes em 2 hipóteses:
1. Quando tenha havido inicio de execução – embora sem prejuízo do uso de meios alternativos;
2. Quando seja seguro ou muito provável que o acto vá produzir efeitos, designadamente quando exista um termo inicial ou uma condição suspensiva de provável verificação.

c. Impugnação de actos de indeferimento expresso
Em principio, sendo os actos de indeferimento expresso verdadeiros actos administrativos, serão susceptíveis de impugnação. Contudo, o legislador prevê que quando se trate de Actos de pura recusa, formal ou substancial, o particular utilize o pedido de condenação da Administração à prática do acto devido, no pressuposto de que esse pedido confere uma tutela mais intensa ao particular; como tal, obriga o juiz a convidar o autor a substituir, com esse sentido, a petição apresentada, quando seja de estrita anulação – art.51, nº4.
Fora dos casos de indeferimento “total e directo”, pode ser utilizado isoladamente este pedido sem grandes duvidas, segundo o Professor Vieira de Andrade.


A Causa de Pedir
A questão principal a resolver no processo – é a da Ilegalidade do acto impugnado – não necessariamente a da lesão de um direito substantivo do particular, que pode nem existir no caso.
O Art. 95º, nº2 prevê que o juiz tem de conhecer de todos vícios invocados no processo e, além disso, deve averiguar oficiosamente a existência de ilegalidades do acto impugnado.

Legitimidade
1. Legitimidade Activa
Art. 55º do CPTA:
                            * No âmbito da “acção particular”:
- A quem seja titular de um interesse directo e pessoal na impugnação – este interesse basta que seja de facto, não se exige a titularidade de um interesse legalmente protegido;
- Às pessoas colectivas privadas, quando aos interesses que lhes cumpra defender – a chamada “acção de grupo” ou “acção colectiva”;
- Às pessoas colectivas públicas, quando defendendo interesses próprios (interesses públicos), no âmbito das relações inter-administrativas, pelo menos quando estejam numa posição de sujeição, bem como aos órgãos administrativos, quando em causa estão actos da mesma pessoa colectiva;

                           * No âmbito da “acção popular”:
- Aos cidadãos eleitores das comunidades locais, para impugnação de actos dos respectivos órgãos autárquicos – através da “acção popular local” – independentemente de interesse directo e pessoal;
- A qualquer pessoa, ao Ministério Público, às autarquias locais, às associações e fundações de defesa de certos interesses “difusos”, relativos a valores e bens comunitários constitucionalmente protegidos – relativo a actos adm lesivos desses interesses (art.9, nº2 CPTA) – chamada a “acção popular administrativa”;

                           * No âmbito da “acção pública”:
- Ministério Público, para defesa da legalidade;
- Aos presidentes dos órgãos colegiais (contra actos do respectivo colégio) ou outras autoridades, nos casos previstos na lei, quando está em causa a defesa da legalidade.

2. Legitimidade Passiva:
Uma das grandes novidades do CPTA é a de que, mesmo relativamente aos meios impugnatórios – ao contrário do que acontecia anteriormente, em que a legitimidade passiva pertencia ao órgão autor do acto – a parte no processo passa a ser a Pessoa Colectiva Publica ou, no caso do Estado, o Ministério, se o acto for da autoria de um órgão integrado numa estrutura ministerial (art.10º, nº2).
Isto acontece excepto quando se trate de impugnação do acto administrativo por outro órgão da mesma pessoa colectiva (nº6).
Sempre que existam contra-interessados, deve ser constituido um litisconsórcio passivo (art.57º)

Efeitos e Prazos
Em regra, a impugnação de um acto administrativo NÃO suspende automaticamente a eficácia do acto, que, se não for nulo, continua a produzir os seus efeitos – nesse caso, é necessário, para que haja essa suspensão, que o interessado peça ao Tribunal a suspensão da eficácia do acto no âmbito de um processo cautelar.
A suspensão da eficácia como efeito automático da impugnação judicial só se verifica nos casos excepcionais previstos na lei e, em geral, por força do nº2 do art.50º do CPTA, quando o acto determine apenas o pagamento de uma quantia certa, sem natureza sancionatória, desde que seja prestada a caução.

Prazos
Pedido de Declaração de Nulidade – apresentado a todo o tempo;
Impugnação do acto anulável:
1 ano quando feito pelo Ministério Publico (contando a partir da prática do acto ou da publicação, se obrigatória);
3 meses para o particular e demais impugnantes e passa a sujeitar-se ao regime dos prazos processuais (do Código de Processo Civil), embora permaneça continuo, deixa de correr nas férias judiciais;

Embora ainda dentro do prazo de um ano, admite-se a impugnação para além dos 3 meses quando se prove a inexigibilidade da impugnação tempestiva a um cidadão normalmente dirigente, concretizada na lei em 3 situações:
1 – em caso de Justo Impedimento;
2 – nos casos de Erro Induzido pela Administração;
3 – Erro desculpável;

O prazo de 3 meses - Só começa a contar a partir da notificação – a notificação deficiente tem efeitos diferentes, conforme a deficiência:
– se não der a conhecer o sentido da decisão, causa a inoponibilidade do acto e, portanto, obsta ao inicio da contagem do prazo de impugnação;
- quando falte a indicação do autor, da data ou dos fundamentos da decisão, permite o requerimento para informação e, eventualmente, a intimação judicial respectiva, com os efeitos de interrupção do prazo.

Efeito da Impugnação Administrativa
- A utilização de meios de impugnação administrativa (reclamações ou recursos, nos termos gerais do CPA ou de legislação especial) suspende o prazo de impugnação judicial do acto, mas não impede o interessado de proceder a esta impugnação na pendência daquela (art.59º, nº4 e 5).
* O prazo da imp. judicial retomará ao seu decurso normal depois de proferida a decisão ou de decorrido o respectivo prazo – impondo o cuidado com a contagem do tempo anterior à impugnação, para que não se deixe perder o prazo de impugnação judicial em caso de insucesso da impugnação administrativa.

Sentença
1. Efeitos Directos:
            a.Constitutivos – nos casos de anulação;
            b.Meramente Declarativos – nas declarações de nulidade ou de inexistência;

2. Efeitos Ultra-constitutivos:
Geram, em regra, por força da retroactividade dos seus efeitos, a obrigação para a Administração de reconstruir a situação de facto de acordo com o julgado, além de ter actuar no respeito pelo decidido.


Concluindo, nesta primeira abordagem à Acção Administrativa Especial abordei apenas a sua vertente de impugnação, sendo que irei colocar ainda um post quanto à condenação à prática de acto devido, que é uma acção muito interessante, principalmente pela história por detrás do seu aparecimento.
Espero que os colegas tenham achado de interesse o post e o tema, estando eu aberta a sugestões de melhoramento do mesmo, visto que me limitei a resumir e a ponderar de forma esquemática sobre a matéria, tendo como base os manuais dos Professores inicialmente indicados, mas tendo como objectivo apresentar uma imagem interessante e proporcionar discussão e ponderação da acção de impugnação de actos.
Como por exemplo o que referi quanto às decisões preliminares. Gostaria de saber a vossa opinião, visto que mesmo da leitura destes autores não consegui captar uma opinião concreta para este problema.


Um resto de bom fim de semana,
Renata Simões
nº17514

1 comentário:

  1. Caros colegas, devido a erro informático do meu computador, o texto que coloquei aqui não inclui grande parte da opinião do Professor Mário Aroso de Almeida, que tinha considerado importante em contraste com o que retirei da opinião do Professor Vieria de Andrade.
    Por isso, se me permitirem colocarei aqui a actualização, visto que o meu PC está algo estranho e não me permite entrar nas alterações dos posts.

    Portanto, relativamente ao acto impugnável:
    Para o Professor Mário Aroso de Almeida é decisivo, para que os actos juridicos concretos possam ser objecto de impugnação, não a sua eficácia externa mas que possuam conteúdo decisório - "que não se esgotem na emissão de uma declaração de ciência, de um juízo de valor ou de uma opinião, mas exprimam uma resolução que determine o rumo de acontecimentos ou o sentido de condutas a adoptar".
    Ainda para o Professor "deve, pois, entender que a (eventual) eficácia externa não é um requisito intrínseco de impugnabilidade dos actos administrativos, mas um requisito que está associado ao estatuto de quem impugna, que o acto só tem de preencher para o efeito de poder impugnado por quem não se encontre integrado na estrutura da própria entidade que o emite e, portanto, que diz respeito à legitimidade para impugnar, e não ao acto em si mesmo".
    Contudo, parece-me complicado ver esta tese no artigo 51º CPTA, 2ª parte, como faz o Professor, sendo que, a meu ver o artigo segue a posição do Professor Vieira de Andrade, tendo como critério base o da eficácia externa e não o caracter decisório, ainda que este possa por vezes possibilitar a impugnabilidade do acto (como por exemplo, artigo 100º e 55º/1,d)).

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