sexta-feira, 29 de abril de 2011

Procedimentos cautelares

           A justificação dos procedimentos cautelares advém do facto de a demora na satisfação judicial do interesse protegido pela acção criar o risco de prejuízo para o seu titular, daí o relevo Constitucional da obtenção de uma decição num prazo razoável e que seja assegurado o “efeito útil da decisão” que sem as Providências Cautelares não é conseguido, muitas vezes (periculum in mora). Por isso a lei permite que, através dum processo mais simples e rápido (summaria cognitio) mas, por isso, menos seguro, demonstrada uma mera probabilidade séria da existência do direito (fumus boni juris), o tribunal possa decretar uma composição provisória do litígio, que permita esperar pela composição definitiva.
Representam uma antecipação ou garantia de eficácia relativamente ao resultado do processo principal e assentam numa análise sumária (summaria cognitio) da situação de facto que permita concluir pela provável existência do direito (fumus boni juris) e pelo receio de que tal direito seja seriamente afectado ou inutilizado se não for decretada uma determinada medida cautelar (periculum in mora).
São finalidades deste instrumento jurídico desde logo, a necessidade de garantir um direito (tomam-se medidas que garantam a utilidade da composição definitiva; em segundo plano visa definir-se uma regulação provisória (define-se uma situação provisória ou transitória) e antecipa-se a tutela pretendida ou requerida (atribui-se o mesmo que se pode obter na composição definitiva.  E assim podem classificar-se em providências de garantia,  providências de regulação e providências de antecipação.
As Providências Cautelares  apresentam como característica a Subsidiariedade: a Providência cautelar não especificada apenas se aplica se ao caso não couber nenhum dos procedimentos nominados, tendo de haver uma adequação da providência ao fim pretendido.
            As Providências Cautelares têm como característica a dependência, sendo que são sempre dependência de uma acção cujo objecto é a própria situação tutelada ou acautelada por isso, a providência cautelar caduca se a acção principal vier a improceder ou se o réu for absolvido da instância e não propuser, dentro do prazo legal, uma nova acção. Podem ser requeridas antes ou durante a pendência da acção principal – preliminar ou incidental.
            Em traços bastante simples, que serão desenvolvidos, temos como características fundamentais das Providências Cautelares no contencioso administrativo a Celeridade (carácter urgente), a Modificabilidade (o tribunal não está adstrito à providência requerida, podendo decretar outra adequada), a Cumulação (pode o requerente solicitar diversas providências num só procedimento, isso significa que se podem cumular diferentes providências comuns, mas também providências comuns e especificadas, basta que na acção principal se possam cumular diferentes pedidos).
            Importa fazermos referência à importância do Princípio da Proporcionalidade, pois, as medidas tomadas não podem impôr ao requerido um sacrifício desproporcionado relativamente aos interesses a acautelar ou tutelar provisoriamente.
A decisão sobre a Providência Cautelar tem uma eficácia relativa, por via de regra, na medida em que, em geral, não produz efeitos de caso julgado na respectiva acção principal e o seu decretamento não é vinculativo na acção principal, já que, julgada esta improcedente, a providência caduca.  
Há um modelo de tramitação tendencialmente uniforme para a generalidade das solicitações, todas elas devendo ser formuladas, desde logo, em " requerimento próprio " ( art 114º, nº1 do CPTA), cujos requisitos externos, como a identificação da entidade demandada e dos contra-interessados a quem a adopção da providência em concreto possa directamente prejudicar são minuciosamente elencados. O proferimento de despacho liminar restringe-se a situações extremas de manifesta falta de fundamento material da pretensão ou à detecção de excepções dilatórias insupríveis, de conhecimento oficioso, regulando-se a citação dos contra-interessados e estabelecendo-se um ordenamento comum relativo à produção e eficácia da prova, no qual se destaca, pela novidade que constitui.
Temos várias características como sendo apontadas para as Providências Cautelares no Contencioso Administrativo, sendo que, desde logo,  à partida, temos o seu cunho instrumental, pois, as Providências Cautelares não gozam de autonomia funcional, dependendo de um processo principal ,ainda que a intentar, perdendo a sua eficácia com a prolação da sentença.
Maria Fernanda Maças, vem dizer-nos que, as Providências Cautelares, ao contrário da acção principal da qual dependem não visam em primeiro plano realizar a justiça mas dar tempo para que a justiça se possa fazer, pois, os processos cautelares destinam-se, antes de mais, a acautelar a utilidade da sentença a proferir num processo que vise a tutela definitiva de uma posição juridicamente relevante, sendo a sua característica principal a instrumentalidade destes face aos processos principais (nº 1 do art 113º do C.P.T.A. e nº 1 do art 383º do C.P.C.).    
A característica da instrumentalidade dos meios cautelares inviabiliza a possibilidade de obtenção, através do decretamento de qualquer providência, de vantagem ou benefício superior à que resultaria do total provimento da causa principal.  
Há que distinguir a instrumentalidade estrutural do processo e a instrumentalidade substancial da providência, sendo que, a primeira se reporta  ao meio processual, ao processo cautelar, e à sua dependência (instrumentalidade) e subordinação face ao processo principal enquanto a segunda respeita à característica e natureza instrumental e provisória da providência cautelar, da concreta medida cautelar, face ao pedido principal.
É de referir, em segundo lugar, o traço característico da provisoriedade da tutela cautelar presente no artº 124º na medida em que, as providências cautelares visam possibilitar, em linhas gerais, uma antecipação transitória do efeito visado no processo principal, mas sem que esse ganho provisório obtido com a providência cautelar signifique a aquisição do que só a título definitivo da sentença produzida na acção principal poderia vir a ser jurisdicionalmente determinado. Desde que adoptada (se adoptada) a providência, continuará ela em vigor até à conclusão do processo principal, podendo, não obstante, porque provisória, ser modificada, substituída ou revogada ao longo do curso da acção principal, se existirem alterações dos factos que o justifiquem nos termos dos arts 388º nº 2 do C.P.C. e 1.º do C.P.T.A.
A sumariedade, consequência da própria natureza instrumental da decisão, pretendendo demonstrar o tipo de cognição superficial que é suposto verificar-se, na obediência dos critérios definidos no artº 120º, quanto ao preenchimento dos requisitos comuns do " periculum in mora " e do " fumus boni iuris", esperando-se do julgador que fundamente a decisão de índole cautelar num mero juízo de verosimilhança quanto à existência do direito alegado, sendo que como nos diz o Sr Professor Castro Mendes, “o conhecimento exaustivo traria somente inconvenientes, pois, nesse caso o processo seria tão moroso como a acção principal, ficando, assim, frustrados os objectivos prosseguidos através dos procedimentos cautelares. "  
A urgência é uma característica bem vincada em toda a tramitação para a obtenção de uma providência cautelar (arts 113º, nº 2 e 36º, nº 1, alínea e e nº 2, essencialmente, podendo captar-se idêntica ponderação ao nível dos arts 118º e 119º).
As Providências Cautelares têm uma vocação funcional imediatista, (arts 122º nº 1 e 127º), sob três tipos distintos de mecanismos (execução forçada, sanção pecuniária compulsória e sujeição dos agentes da Administração Pública a responsabilidade civil e disciplinar), tendo como objectivo a obtenção do efeito imediato do seu cumprimento por parte da Administração, cabendo assinalar, em tais termos, essa mesma vocação natural, que deve ser observada logo a partir da notificação da pertinente decisão, sem que se tenha de aguardar pelo trânsito em julgado, visto o efeito meramente devolutivo dos recursos que venham a ser interpostos de decisões respeitantes à adopção das providências cautelares (143.º n.º2).                                                                                                             
            São, em síntese, pressupostos das Providências Cautelares o periculum in mora, sendo este um elemento constitutivo da providência, se não existir esta não será decretada, o Fumus boni juris, sendo esta consequência da summaria cognitio, o grau de prova tem de ser apenas suficiente para a demonstração da situação jurídica que se pretende acautelar ou tutelar provisoriamente. Mas o mesmo vale para a demonstração pelo requerido do excesso da providência e para a contraprova realizada pelo requerido para a qual basta que sejam demonstradas dúvidas sobre a probabilidade dos factos alegados pelo requerente.
O art 112º, nº2 prevê a máxima amplitude substancial das medidas cautelares, sendo que se  procedeu no C.P.T.A., com a Reforma, à integração de uma ampla viabilidade de utilização, das providências cautelares na concepção do direito à tutela judicial efectiva ao abrigo dos arts 20º e 268º, nº 4 da C.R.P.
Existe um vasto conjunto de Providências Cautelares nominadas, havendo a possibilidade de adopção de quaisquer medidas cautelares, sendo que o art 112º, nº2 não exclui a utilização de outros meios, tipicamente administrativos ou de previstos no CPC. Carla Amado Gomes considera que a "introdução, no processo administrativo, de medidas cautelares atípicas, que possibilitem aos particulares vencer os efeitos da inércia dos serviços administrativos na concessão de autorizações", sem deixar, contudo, de advertir para "o melindre de tal utilização, na medida em que (...) a actividade administrativa neste domínio está eivada de forte discricionariedade ".
A Enunciação exemplificativa do art 112º, nº 2 do CPTA como nos diz Freitas do Amaral, "também aqui, em matéria de providências cautelares, passámos definitivamente de um contencioso de mera anulação (...) para um contencioso de plena jurisdição,  que comporta toda uma vasta gama de providências cautelares, que podem ir até à intimação da Administração a realizar prestações de fazer ou de não fazer, de pagar, ou de dar, e que designadamente podem incluir a intimação, que é como quem diz a condenação, da Administração, a não praticar um acto administrativo".
As Providências Cautelares nominativas que surgem no Código são, para além da suspensão da eficácia de um acto administrativo (objecto de tipificação nos arts 128º e 129º), a da suspensão de eficácia de normas regulamentares (no condicionalismo requerido pelos arts 130º e 72º e ss), a admissão provisória em concursos e exames, a atribuição provisória da disponibilidade de um bem, a autorização provisória da disponibilidade de um bem, a autorização provisória ao interessado para iniciar ou prosseguir uma actividade ou adoptar uma conduta, a regulação provisória de situações jurídicas e a intimação para a adopção ou abstenção de uma conduta por parte da Administração ou de um particular por alegada violação ou fundado receio de violação de normas de direito administrativo.
            A (nova) suspensão de eficácia, como refere o Sr Professor Vieira de Andrade , " pressupondo, em regra, o perigo de facto consumado ou de prejuízo de difícil reparação, é decretada em função de considerações de juridicidade material prima facie e em conformidade com uma ponderação de todos os interesses, públicos e privados em presençaagora sem o autoritarismo da presunção da legalidade do acto e negando a preponderância sistemática do interesse público que o acto visaria prosseguir", a situação de tolhimento da Administração quanto ao projectado início ou prosseguimento da execução do acto, bem assim quanto à sua exposição, em caso de execução indevida, a declaração judicial de ineficácia, tanto assim, de resto, até que seja proferida decisão de indeferimento do pedido de suspensão de eficácia; depois, para acentuar, no estreito capítulo das atinentes novidades, a introduzida pelo art.º 128.º n.º 4, ao permitir que o juiz decrete, agora, para além da suspensão da eficácia do acto, a requerimento do interessado e até ao trânsito em julgado, a ineficácia dos actos que, porventura, tenham sido praticados contra o conteúdo da própria decisão suspensiva, por isso mesmo qualificados de " execução indevida ".
Por seu turno, no que concerne à matéria das Providências Cautelares, importa percebermos a diferença estrutural e funcional entre esta intimação, que é providência cautelar, e as também denominadas " intimação para a prestação de informação, consulta de processos ou passagem de certidões " (arts 104º a 108º) e a "intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias" (109º a 111º): ainda que também caracterizadas pela urgência, estes são, contudo, "processos autónomos (...) que se baseiam numa cognição sumária mas suficiente (...), permitindo decisões definitivas, visando-se a defesa de um determinado direito ou interesse, que põe fim à lide, formando caso julgado material ".        
Com a Reforma, existiu a adição de duas novas providências cautelares tipificadas (132º e 133º), com fundamento na especificidade das correspondentes relações jurídico-administrativas: as relativas à apreciação dos vícios dos actos administrativos atinentes à formação de contratos e à " regulação provisória do pagamento de quantias ".
Quanto, concretamente, à respectiva tramitação, pensa-se que se remete, no aparentemente pouco cuidado n.º 3 do preceito em foco, para o processado comum dos art.ºs 114.º e ss, com as ressalvas logo adiante enunciadas, cumprido ainda destacar, a respeito do singular critério de decisão consagrado no nº 6, que se justificará a introduzida flexibilização dos pressupostos comuns das providências cautelares (120º nº 1 a 3).
No artº 133º, por seu turno, passando a distinta tipificação, pretendeu o legislador introduzir no universo cautelar uma medida de aplicação genérica, sujeitando a Administração, por exemplo em litígios relativos às prestações pecuniárias de carácter social, à imposição do pagamento provisório de uma quantia em dinheiro, facultando-se, assim, ao administrado que requeira, em casos que possam envolver, por grave carência de meios, consequências muito danosas para a sua pessoa ou dos seus familiares, a regulação transitória da situação, em vista da definição de uma quantia mínima absolutamente necessária ao enfrentamento da realidade vivida, até que sobrevenha decisão final, no processo dominante.
Espaço aberto, de novo, para a obtenção de antecipação de (pelo menos) parte do objecto do pedido formulado naquele processo, assim se configurando um outro afloramento do regime geral de aquisição antecipada de pretensões, nos termos do artº 121º.  
O Tribunal tem, ao abrigo do art  120º, nº3 um poder de adequação material.
Fez-se como nos é dito por Mário Aroso de Almeida e Carlos A.F. Cadilha, um desvio ao princípio do dispositivo, da faculdade de modelar os contornos da providência concretamente requerida, ou mesmo de a configurar diversamente, desde que a desejada tutela se revele mais eficazmente assegurada através desse meio. Não estando o tribunal já vinculado, nos termos do nº 3 do artº 392º do C.P.C., à providência concretamente requerida, podendo, por isso, adoptar outra que se compreenda no seu conteúdo original, sustenta-se ter-se pretendido ir mais longe, no C.P.T.A., conferindo-se ao juiz mais latos "poderes de conformação", ainda, sobretudo para garantir o aproveitamento da petição na hipótese de demonstração de produção inaceitável de danos, com a requerida concessão, e, assim, face à perspectiva da sua absoluta recusa, à luz do disposto no artº 120º, nº 2.
Tem havido neste âmbito alguma discussão ,pois, dado que, pese embora se represente a inexistência de vinculação estrita do tribunal administrativo ao princípio do pedido, havendo também que atender ao princípio do inquisitório e viabilizando a realização de uma qualificação jurídica diversa da revelada no requerimento do administrado, duvida-se se poderá ser decretada outra qualquer providência que seja mais lesiva do interesse público, nada se opondo, no entanto, em caso de menor "lesividade".
Temos um princípio de Livre cumulação de pretensões cautelares (112º, nº 1 e 120º, nº 3), sendo este um corolário do princípio da livre cumulação de pedidos, estabelecido nos arts 4º, 5º e 21º do CPTA.
O requerimento da providência Cautelar tanto pode ser deduzido antes, depois, ou ainda ao mesmo tempo da propositura do processo principal, introduzindo-se com a Reforma, a possibilidade de desencadeamento do processo cautelar na pendência do processo dominante, até que ocorra caducidade, com o respectivo trânsito em julgado (123º, nº 1, f). Há, deste modo, uma viabilidade de dedução, também, na pendência do processo principal (114º, nº 1, alínea f).
É de assinalar, em face da classificação presente no artº 381º, nº 1 do C.P.C., que, enquanto na alínea b) do nº 1 do artº 120º do C.P.T.A. que contempla, explicitamente, as providências asseguradoras ou de tipo conservatório (aquelas que visam manter inalterada até à decisão final a situação de facto existente, quando colocado o requerente, por exemplo, em resultado de acto administrativo, perante uma ameaça de perda de um bem ou uma determinação no sentido da abstenção do uso de certa coisa) é exigido um " fumus " leve ("não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular"), na alínea c) do mesmo nº 1, reportada, por seu turno, às providências de natureza antecipatória (as que visam alcançar interinamente o direito alegado no processo principal, produzindo os expectáveis efeitos resultantes da decisão definitiva, se se intima o requerido a adoptar certo comportamento, como a atribuição provisória de um subsídio ou a admissão de uma pessoa, provisoriamente, a um concurso) se requer, já, um " fumus " mais intenso ("seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente ").
Enquanto no primeiro caso se decidirá, a final, previsivelmente, em termos que comportarão o efeito provisório pretendido, absorvendo-o, mantendo-se uma situação de facto identificada, no das providências antecipatórias, ao contrário, o que se prefigura é uma alteração do status quo, originando uma composição provisória da lide, ex-novo, sendo que, nesta eventualidade, deve haver maior grau de exigência probatória.
Por vezes, assiste-se a uma sobreposição entre as funções conservatória e antecipatória sendo que, não é pela simples circunstância de uma determinada providência cautelar antecipar certos efeitos da decisão definitiva que, sem mais, se deva concluir que  nos encontramos perante uma providência antecipatória.
Critério, enfim, que, como toda a regra, comporta as excepções plasmadas na alínea a do citado n.º 1 e no n.º 6 do referido art.º 120º, para as situações limite em que, respectivamente, se afigure totalmente líquido ( " designadamente por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal, de acto de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de acto idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou inexistente") que a pretensão deduzida no processo principal procederá ou que nela esteja apenas em causa o pagamento de quantia certa, sem natureza sancionatória", não se justificando, pois, em qualquer dos casos, mais indagações. 
Há, no campo das Providências Cautelares no Contencioso Administrativo, uma recepção das regras gerais estabelecidas no direito comum sobre a repartição do ónus da prova (art 114º nº3, alíneas g e h, 118º nº 1 e 2 e 120º nº 5). A " falta de oposição " aludida no artº 118º, nº 1 do C.P.T.A. implicará a presunção da veracidade dos factos invocados pelo requerente e que, deduzida, embora, contestação, o eventual incumprimento daquele ónus impugnatório, quanto a alguma parcela factual relevante vasada no requerimento, traduzirá, na óptica de Mário Aroso de Almeida, a imediata aquisição de tal materialidade, nos termos gerais dos arts 490º nº 1 e 490º n.º 2 do C.P.C., sendo que,  a falta de contestação por parte da autoridade requerida ou a não alegação de que a adopção das providências requeridas causa grave lesão ao interesse público tem ainda um efeito cominatório complementar, que se traduz no reconhecimento, por parte do juiz, para efeito da decisão a adoptar, da inexistência de tal lesão, salvo quando ela seja manifesta ou ostensiva ( art.º 120.º n.º 5 ).
Sucede, pois, quanto à solução legal propugnada a respeito do incumprimento do ónus impugnatório, em sede cautelar, que resulta, no caso, por previsão expressa do legislador, o afastamento da aplicação subsidiária do processo civil, no que concerne(ria) à ponderação conjugada dos arts 384º nº 3 e 303º nº 3 do C.P.C. e 83º nº 4 do C.P.T.A.    
No contencioso administrativo das Providências Cautelares há a adopção do princípio " pro actione " (7º, 12º nº 3, 114º nº 4 e 5 e 116º nº 3 e 4), sendo que, à semelhança do instituído no C.P.C., no contencioso administrativo também se verifica a imposição de uma interpretação das normas adjectivas no sentido mais favorável à continuidade do procedimento, visando o aproveitamento possível dos actos viciados e a sanação desses defeitos.
A Administração tem, de acordo com os arts 87º, nº 1, 88º, nº 1, 89º, nº 1, 90º, nº 1 e 92º do C.P.A., o dever de suprir ou mandar suprir os vícios formais susceptíveis de sanação, regularizando a instância.
Parece de aceitar, na fase da apreciação liminar do requerimento, preferindo o princípio da tutela judicial efectiva à denominada " psicose de urgência " deste contencioso, o suprimento da falta de pressupostos processuais ou mesmo a apresentação de articulado superveniente que incida sobre a invocação de excepções dilatórias prontamente reparáveis; mas já se duvidando que, fora da previsão do n.º 2 do art.º 117.º, idêntica abertura se deva operar relativamente à intervenção de terceiros interessados.    
Pode haver a Convolação do processo cautelar em processo principal (art 121º). Assiste-se, no nº 1 do art 121º, à consagração da possibilidade de o tribunal antecipar, definitivamente, no processo cautelar, a decisão sobre o mérito da causa, convolando a tutela cautelar em tutela final urgente, nas situações limite em que, por manifesta urgência na resolução definitiva do caso, mormente por alteração das circunstâncias de facto, se não compadeça, aquele, com o mero decretamento provisório da providência requerida, desde que o tribunal se considere, razoavelmente, com base apenas num exercício sumário mas suficientemente límpido de apreciação das circunstâncias de facto definidas e da pertinente aplicação do mérito, ouvidas as partes, em condições de estabelecer o quadro final essencial de aplicação do direito peticionado na acção dominante. Se puder figurar-se, nesse processo, através de outras provas, a alteração da base factual, ainda que sensível então, deverá ser observado o critério do artº 120º, sem prejuízo do recurso excepcional ao mecanismo do nº 1, alínea a) do aludido preceito.
Regista-se, também, por outro lado, a introdução da possibilidade, de um célere regime de decretamento provisório da providência (48 horas), de aplicação não tipificada mas subordinado, sempre, para além da tutela de direitos fundamentais, também a "situações de especial urgência", no fito de se evitar o periculum in mora do próprio processo cautelar.
Parte-se, aqui, com efeito, da representação da mora do próprio processo cautelar, por vezes tramitado durante várias semanas ou mesmo mais de um semestre, o que pode reclamar, verificada a particular circunstância de " especial urgência "conceito relativamente vago mas que, seguramente, se não há-de confundir com o comum requisito " periculum in mora " figurado no art.º 120.º n.º 1, alíneas b e c, porque necessariamente mais exigente, tal é, designadamente, a notada referência à acuidade da protecção de direitos fundamentais, a produção de uma primeira decisão provisória, tanto bastará, sobre o mérito.
Provisória, como tem de ser (art 124º), mas praticamente imediata, sob pena de se esgotar o interesse da própria pretensão principal, como sucederia, por hipótese, no caso de recusa de renovação do passaporte de cidadão nacional que justifique ter absoluta necessidade, por razões profissionais, de se deslocar para o exterior do país, ou de não deferimento de um pedido de asilo, sujeitos que, nem por isso, em tais termos, passariam a contar com uma decisão antecipada definitiva sobre o fundo da causa, mas que veriam garantido, enquanto não encerrado, pelo menos, o curso normal do processo cautelar, o direito alegado no processo principal. Por isso se alude, ao tratar-se deste mecanismo de urgência, a uma espécie de processo cautelar primário inserido no típico processo cautelar (" cautelar do cautelar ").
                                                                          

Janine Lopes Saraiva, nº17325

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